Ar@quém News - terça-feira, 12 de junho de 2012

Se o tempo passa, os exemplos persistem

Às tardes, praticamente toda semana, ouvia ritmadas batidas no portão lá de casa. Um senhor moreno, de pele tão ressecada que chegava a brilhar, calçado com o familiar par de sandálias havaianas, parcialmente protegido do sol pelo inseparável e sempre soado chapéu de palha, e as mangas longas arregaçadas à altura dos cotovelos, batia a bengala, como que numa música ritual, insistente. Era meu avô, chamando-nos ao seu encontro para um momento de prosas e alegres gargalhadas, daquelas dum jeito que não consigo esquecer, típicas dele: soltas, descompromissadas, como se abraçassem a alma através dos ouvidos.

Havia cada história... Histórias de luta, de dor, como também de conquista e de fé. Um homem do povo, exemplar! O velho carpinteiro e agricultor de mão calejada e pé rachado pela quentura dos torrões da caatinga, humilde ar, dava-nos uma graça. Mal sabia eu o seu valor... Pobre moleque, ignorante, apenas o acompanhava e a meu pai, por vezes, ainda, dando uma de enxerido, cutucando a conversa... Recebia um ou outro puxão de orelha verbal (ora mais menino!), como represália, ou mesmo provocando riso em razão do besteirol.

Vejo, hoje, porém, as tardes chegarem e se esvaírem e o portão continuar silencioso. Dá-me um aperto no peito! Quão bom seria tê-lo novamente conosco, sentado na cadeira num canto reservado da sala, tal qual outrora. Foi-se, entretanto sua lembrança ainda se faz presente e o vitaliza para mim, muita embora a falta não finde.

Benedito Gomes Rodrigues
 
 
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