Ar@quém News - domingo, 31 de março de 2013

Doméstica, entre os benefícios da lei e os percalços da vida

Na tarde de 27 de março de 2013, fomos surpreendidos por algo histórico para o Brasil, quando aconteceu a aprovação por unanimidade no Senado Federal do projeto de lei que regulamenta as relações trabalhistas dos serviços domésticos. Podemos considerar um grande avanço para um país que se afirma como Estado democrático.

Na aprovação da referida lei, vemos um reparo histórico para uma ocupação colocada à margem da sociedade, até muito recente não reconhecida profissão. Por isso, quando não se podia definir a profissão de uma mulher, sobretudo no meio rural, dizia-se e ainda se diz ser doméstica. Assim, ocorre o registro para declarar profissão, requerer o título de leitor, casamento civil. Atualmente, isso tem provocado muita contradição entre ser ou não ser doméstica, principalmente para as que desejam requerer como segurada especial da previdência, para o beneficio de aposentadoria ou licença maternidade.

O Brasil tem sido benevolente, a partir da Constituição de 1988, onde muitas conquistas e direitos decorrem de um Estado que vivencia sua experiência de democracia. No entanto, a sociedade brasileira convive com estrutura dominante de resquício feudal, uma elite que pouco ou nada faz para reduzir as desigualdades sociais, considera que tudo é responsabilidade do Estado, do governo; temos uma educação que privilegia os privilegiados, a exemplo dos que estudam nas universidades públicas brasileiras em cursos de grande relevo, ainda temos uma das maiores carga tributárias, que muito cobra e pouco retorna a sociedade.

O processo de dominação das domésticas tem origem no Brasil escravocrata, fortalecido pela estrutura fundiária e pela não universalização da educação. Então, somos um país de leis avançadas, mas a legislação enfrenta muitos obstáculos para se tornar realidade, como a baixa funcionalidade dos aparelhos técnicos, jurídicos, burocráticos e até éticos. Com isso, temos pouquíssimo controle, fiscalização no exercício da lei.

Portanto, para que exista funcionalidade da lei de beneficio às domésticas, vários elementos precisam funcionar, pois temos exemplos de legislação importante que não consegue responder os desafios, uma vez que a abertura para a ilegalidade é muito maior. A referida lei é de um impacto social enorme, no entanto a estrutura pública precisa ser mais eficiente, com aplicação de vários mecanismos que facilitem a aplicabilidade, do contrário estaremos apenas fortalecendo a informalidade das empregadas domésticas que agora passa a ser ilegal.

Nessa mensagem, quero homenagear um grupo de seres humanos muito importantes na sociedade brasileira, uma posição ocupada na sua grande maioria por mulheres. Nossa gratidão, respeito àquelas: que de forma prática, misteriosa e no anonimato cuidam de todos, dos teus, dos nossos filhos; escutam todos os segredos, mas não falam nada, a primeira chegar, a última a sair do trabalho, recebem os menores salários, a ausência de horas extras; cuidam dos meninos como mãe, tia e avó e às vezes enfrentam a invasão de valores éticos e morais, a acusação e vivência do assédio sexual. A lei das empregadas domésticas é apenas mais um motivo de luta pelos direitos e a necessidade de se tornar realidade.

Benedito Lourenço
Graduado em Filosofia, presidente da Fundação CIS (Coreaú-CE)
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